18 de julho de 2011

Delicado (eu não existo dentro de mim)

E, de certa forma, aquele sonho lhe parecia um tanto confuso. Ele ouvia uma melodia de violoncelos tocando sua alma aos poucos. O lugar estava cheio de pessoas que não passavam de multidão. Eram ele e eles todos. Sua única companhia. Mas existia algum porquê para aquilo tudo. Ele só almejava a resposta a ser encontrada.

Procurou quem procurava. Encontre-me na escada. E lá foi ele. A escada era sombria e escura, mas ele conseguia manejar bem aquela situação. Aprendeu a não demonstrar seus medos para qualquer um. Aprendeu a não ser frágil. Não sou frágil, menteve em mente o pensamento. Se pelo menos eu achasse quem procuro.

As pessoas olhavam para um palco vazio, intensamente brilhante. Olhavam para o nada e o nada lhes retornava a satisfação para que olhassem tão fanaticamente um ponto enquanto, do outro lado, a vida passava. Enquanto a vida lhes passava pelos dedos do pé, como caminhar na orla. Como a muito não caminhava na orla. Caminhava neste instante.

A escada não lhe oferecia nada, a não ser medo e escuridão. A escada lhe apresentava na forma de desvio da atenção com o qual todas as outras pessoas tanto ensandeciam. Olhava pacientemente e um grito no fundo de tudo ia crescendo sua alma, abafando os violoncelos. O grito crescia a cada novo segundo de sonho que olhava fixamente para aquele novo ponto.

A pessoa por quem procurava chega. Diz algo como uma expressão cordial. Uma cordialidade bem pouco pessoal. O violoncelos arranhavam seus ouvidos. Ia roubando a pouca paz que havia presente naquele sonho. Ainda assim, parecia isso ser o som mais melódico em meio àquela confusão. Preciso me manter em pé. Preciso de casa. Mas eu vou para casa e ninguém notará o que se passa aqui dentro.

Assim, caminhou contra as ondas daquele grande mar, aquele mar que nem era salgado, nem era doce. Também não era insípido. Era escuro. Algo como um verde sujo. Algo como um mar sujo. Algo como sujeira suja. Verde sujo. E as pessoas não lhe notavam porque ele aprendeu a fingir sentimentos muito bem. Só quem lhe via o sofrimento eram as águas daquele grande mar de cor verde sujo.

Ao chegar em sua casa, tentou vasculhar em sua caixa favorita. E procurou bem no fundo de sua memória aquele momento de conversa cordial. E não conseguia achar, porque tudo do que se lembrava era do som dos violinos arranhando seus tímpanos. Também lembrava-se de sua expressão ao emitir um sorriso cordial forçado. Ele sabia fingir bem. Ele deveria mentir bem.

E o som ficava mais profundo e presente do que pretérito. E o som ficava intenso a cada vez que tentava vasculhar o arquivo de imagens daquele instante. E o som o impedia de ver como numa sinestesia louca. E o mar tocava-lhe os pés e ele conseguia percebeu que a vida ia embora, passava lenta, corria mais que o lobo e ele não estava nem aí.

Até que um flash maluco lhe mostra o arquivo por que procurava. Ali estava imagem. Ali estava o sorriso. Não, não pode ser! A imagem havia sido alterada por sua mente. Os violoncelos arranhantes lhe apagaram metade da imagem que seu cérebro produzia nostalgicamente. Como posso me lembrar das cenas que existem pela metade? Como posso ver somente minha face e nada mais? Como pôde fazer isso comigo, mente falha?

Encostou a cabeça na parede que se encontrava mais próxima de sua cabeça. O mar passava pelos dedos do pé. Os violoncelos tocavam docemente uma melodia delicada. Delicada é minha mente, que nem sequer pôde guardar uma imagem, uma expressão, um gesto. Delicado é meu coração. As pessoas não estavam mais lá, ele encontrou um esconderijo muito bom. Lá, ele conseguiu tirar sua máscara, com muito esforço. Era como se, quanto mais a usasse, mais ela grudava em sua epiderme.

Ele só conseguia se ver. A imagem estava cortada. Tem alguma coisa que eu preciso descobrir. E parece que a mente deu uma trégua e o ajudou a ver o que buscava. As imagens cortada se juntava tão perfeitamente que o fez pular do lugar aonde estava, fazendo as águas que lhe batiam os pés pularem junto, conforme a música mudava de harmonia. Se ele pegasse as imagem de si mesmo e juntasse, teria um perfeito diálogo. Era isso, ele esteve sozinho tempo todo. Não há mar, não há multidão. Não há palco muito menos diálogo cordial. Havia uma briga entre aqueles que lhe habitavam a cabeça. E eles queriam cantar. E abriam as bocas para cantar violoncelos arranhando os tímpanos.

João Hernesto

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