29 de julho de 2009

“(…) how much I love you.”


Então ele fechou os olhos.
Eles se deitaram na cama de solteiro, como costumavam fazer durante as noites e as manhãs que podiam passar juntos. “Eu senti sua falta”, disse. “O amor não se descreve, sente-se” o outro respondeu.
Eles deitaram-se um de frente para o outro e, como quem interrompe algo, suas pernas se encontraram, interrompendo, assim um olhar que parecia ter durado uma eternidade no relógio dos amantes.
Pernas, pés, mãos, braços, troncos, olhos, lábios, línguas, bochechas, dentes, unhas, barrigas, umbigos, pênis, nádegas eles eram. Toque eles eram.
O que estava à esquerda se levantou mostrando, assim, um corpo de praia. Um corpo de garoto crescido. Ele subiu em seu corpo, e manteve os lábios não muito longe dos outros lábios. Eles se olhavam, só queriam se olhar. Agradeciam por poderem se olhar naquele momento.
“Amo-te”, disse o de cima. E o de baixo não respondeu nada verbalmente. Ele disse com os olhos. Disse com um leve sorriso que deixou aparecer.
Uma lágrima caiu sobre seu rosto, de modo que ele não expressava dor alguma em sua face, não expressava força nem mesmo friccionava as maças do rosto ou as sobrancelhas. A lágrima simplesmente caiu, como cai um pássaro quando está a aprender a voar. Caiu assim como cai fruta madura do pé, pesada. Essa lágrima disse “Eu te amo”.
Pouco depois um som começava a sair sem muita força de sua boca emocionada: “Seu diabo”, sussurrou. O de cima sorriu e depois riu. “Eu senti sua falta”, “Eu também senti a sua”.
“A sua carta me fez chorar”, “Também me fez”.
Nesse momento ele abriu os olhos e notou estar sozinho novamente. Secou a lágrima que correra de seu rosto e ele não percebera. Aconchegou-se em sua cama de solteiro.

João Hernesto

24 de julho de 2009

Quem são os Beatles?


- Ainda bem que voltamos, que não entramos em casa. Pelo menos a inspiração veio que nem vem o cachorro quando seu dono chama – me pareceu um comentário totalmente inútil, mas foi pertinente, já que resultou nesse texto que o leitor (vossa senhoria) está prestes a ler.
As ruas estavam bem cheias. A praça da cidade nem se fala. Mal posso arriscar contar quantas pessoas estavam presentes naquele show de meia tigela. Nós havíamos acabado de deixar o teatro e resolvemos infiltramo-nos em meio à plateia assídua. Ele escutava com suas mãos na cintura. Prestem bem atenção, as mãos na cintura, mas os pés estavam acompanhando o ritmo. Um simples e mero estudo de linguagem corporal preveria que aquela cara de insatisfação e de blasé não era real, não expressava o sentimento contido em seu peito. Ele gostava daquela bandinha que fingia tocar Beatles. Quem são os Beatles para eles?! Aquele vocalista com pinta do que na minha época chamávamos de CDF, ele não devia conhecer música alguma que não fosse Twist and Shout.
- A próxima também é dos Beatles – ele disse. “Well, we danced through the night”, dizia. Na verdade, parecia ser o único verso que o panaquinha sabia cantar em inglês, e o Leandro cantava a música toda como se realmente conhecesse Beatles.
- Você não conhece realmente Beatles, certo?
- Mas é claro que sim. Adoro! Você não?
Os besouros, como gostávamos de chamar eu e meu irmão, eram tudo para nós. Eram a melhor banda, são os melhores em toda a minha vida. Eles me mostraram a atitude do bom e velho roque em rou. Eles e Mafalda cresceram comigo. Agora, quem são os Beatles para a geração dos 90 e do 00? Quem são os Beatles, se não forem quem eu sei que são? Que eram. Não, “que são” mesmo.
Depois de ele mostrar seus dotes linguisticos, que (diga-se de passagem) eram bem melhores do que os do vocalista, eis que reparo em uma garotinha, por assim dizer, a olhar o meu rapaz. Ela o olhava, e admirava seus dotes linguísticos, sua expressão blasé e ao mesmo tempo interessadíssima, e sua beleza, é claro. A sua beleza a inspirava o olhar. Franjinha batendo no olho, a ponto de prejudicar a visão. Além da bela franja, o cabelinho curto no pescoço, enroladinho para fora, só nas pontas. Ela era baixa, mas usava salto alto, para ficar mais baixa, obviamente – nenhum homem desiste da idéia de não reparar nas mais baixas que colocam salto estrategicamente para beijar algum pretendente. Ela o olhava e esperava olhar de volta, mas ele estava vidrado, de um jeito desinteressado, na banda medíocre a cantar Beatles mediocremente. Reparei que esse jeito desinteressado é a nova moda entre os novos seguidores do roque em rou.
- Vamos comer lanche de trailer?
- Claro, vamos também morrer de colesterol?
- E ainda pagar por isso! Quanto benefício, meu deus.
Resolvi aceitar, mas deixando claro que não havia-me esquecido do convite que o fiz para tomar vinho comigo. Ele não havia-se esquecido, ainda bem.
Quando saímos do teatro, resolvemos passar em sua casa para buscar uma blusa de frio. Mas não entramos, ele simplesmente não quis mais. Bem típica inconstância de meu amigo. Depois ele disse que serviu de inspiração. Não sei se acredito.
Depois de entupirmos as veias de óleo Liza, fomos finalmente para minha casa; ele cumprira a promessa depois de muito tempo! Na verdade já faz um tempo que o Leandro me deixa de lado para ficar com seu amigo novo, sua prioridade. Ele o chama de luz, desculpe, na verdade é Luz.
- Este vinho não é dos baratos, mas é muito bom também – senti sua cara de decepção.
Aliás, uma ótima qualidade dele é a expressão facial. Sempre me diz tudo o que preciso saber e ele não contaria por delicadeza e por cordialidade.
Depois de ele começar a embananar as palavras, resolvi colocá-lo contra a parede:
- Quem são os Beatles?
- Os Beatles? Porque essa pergunta agora? – ele fez silêncio a favor de que eu esquecesse a pergunta, como não esqueci ele prosseguiu - Bem, os Beatles são uns carinhas aí que tocaram nos anos 60, eu acho. Minha mãe sabe dizer exatamente. Ela adorava dançar ao som deles. Na verdade eu fui descobrir os Beatles além do Twist and Shout – eu sabia que era só isso o que ele conhecia! – aqui em Mariana. Um amigo estava ouvindo uma fita tape deles. Mas quem é que ouve fita tape em 2009? Era 2008 na época, para falar a verdade. Talvez faça mais sentido agora. A questão é que ele estava ouvindo e eu resolvi ouvir. Ouvi, gostei, e hoje eu sou fã!
- Fã?! Quem são os Beatles para você, menino?!
- Esse é do tipo de pergunta para não se responde, ?
Fiz que sim com a cabeça.
- Bem, está bem tarde e amanhã eu gostaria muito de acordar cedo.Vou caminhar com um pessoal em uma trilha aí... Vai ser bem legal, eu espero.
Eu abri a porta e despedimo-nos.
Depois que fechei a porta, liguei o toca-discos e botei um bolachão para tocar. O que é que era? Beatles!
Deixei o humor para o final do texto, caro leitor. Quando abri a porta no começo dessa noite era ele. “Vamos sair?”.
- Vamos! Claro! Vamos ao banco?!
- Na verdade eu estava pensando em um programa mais... interessante. Vamos ao teatro? Ouvi dizer que a peça é ótima!
- Vamos.
Ele me esperava buscar a carteira cantarolando uma música que me lembrava Twist and Shout, mas ele não devia conhecer essa música.
As ruas estavam bem cheias. A praça da cidade nem se fala. Mal posso arriscar contar quantas pessoas estavam presentes naquele show de meia tigela. Nós havíamos acabado de deixar o teatro e resolvemos infiltramo-nos em meio à plateia assídua.

(...)

João Hernesto

21 de julho de 2009

Filosofias acerca da Luz

Mariana, madrugada de vinte e dois do mês de Julho de 2009. Início: 01:01. Término: 01:46.
Gostaria de fazer uma carta grande e vistosa. Uma carta bonita, mas você pode não ler, não gostar e achar baboseira. Vou filosofar um pouco, espero chegar em algum lugar. Honestamente, não sei se você vai ler, não sei se vai gostar. Escrevo só como um mero protótipo de presente para esse dia que é para nós a celebração de um mês de namoro conceituado.
O amor. Já devo-lhe ter falado coisas do tipo. Visto que meu ponto de vista tem mudado bastante, quero deixar bem delimitado minhas crenças hoje. Sendo eu inconstante, elas podem mudar totalmente amanhã. Portanto, está escrito, está comprovado.
O amor. Eu acredito que nós viemos ao mundo com um intuito, o de tornarmo-nos espiritualizados. Ponto. Essa espiritualização (não confundamos espírito - obra etérea e concretizada da Grande Mãe e do Deus Tríplice - de alma - simples passagem de nossa existência minimalista por uma vida dentre muitas que temos. que passar) é atingida através do único sentimento (não estado emocional, o que é bem diferente, a meu ver) que os seres humanos sentem igualmente e de forma intensa homogeneamente: o Amor. Deixo o sentimento em letras maiúsculas a partir de agora em meus escritos com o intuito de santificar esse sentimento. Para mim, esse sentimento capacita-nos eternizar o amor divino. Esse sentimento é a eternidade de qualquer espírito. Ele é o propósito de nossa existência. Ele é o único caminho para nossa espiritualização.
Nós não somos epiderme, tecido ósseo, cartilaginoso, órgãos e sangue. Não somos cérebro, não somos sequer pensantes. Nós temos apenas um espírito que nos convida à busca constante desse Amor. Nós somos almas de um mundo animado e dotado de energia e devemos buscar outras almas. Nós não buscamos corpos físicos, buscamos almas. Buscamos nossos vestígios anteriormente tocados que ficaram em outras passagens pela Terra.
Nós passamos por aqui muitas vezes e, a cada passagem, cativamos almas novas e antigas. Em cada nova passagem, procuramos encontrar essas almas cativadas. Achamos, obviamente. Quando encontramos aquela pessoa que possui um círculo de energia brilhante, nós só achamos explicações em vidas passadas. Não vejo outra explicação que melhor denonime tal sensação. Não vejo outra explicação convincente que não seja supersticiosa.
Caminhei muito e perambulei muito até poder me ver livre de tudo o que já aprendi nessa minha imensa vida para acreditar que nós somos parte de um mesmo mundo. O Anima Mundi só nos é possível e aceitável quando acreditamos no Amor como grande e única virtude que nos é posta. Ele é como um presente dos deuses. Ele é o tudo e o nada. O verdadeiro Alfa e o verdadeiro Ômega. Eu persisti na ideia de simplesmente morrer e me encontrar com Deus para ele dizer que minha vida toda foi baseada numa dicotomia e num maniqueísmo imposto por parâmetros prescritos por alguém de péssimo gosto e de imaginação limitada.
O Amor é a busca. Não há outra palavra. Nós somos ansiosos por alguém que venha-nos completar. Não sei se acredito mais em almas gêmeas e em Outras Partes. Não sei se acredito em divisões espirituais no mundo das ideias ou na Summerland. Acredito no que me é palpável. O Amor me é. Ele é a razão pela qual eu escrevo tudo isso, que provavelmente, caro leitor, diga nada para você. Esse texto não é uma crônica nem é uma carta. Ele é uma organização de meus pensamentos. Eles estão sempre mudando, mas, hoje, resolvi tentar juntar o quebra-cabeças da minha cabeça.
O que eu quero usar como conclusão: essa Luz, eu vejo delimitada quando eu olho para você. Ela passa pela sua cabeça e te contorna o queixo e pescoço. Ela contorna o tronco, membros, e pés. Ele o contorna e me mostra que, não importa a explicação religiosa ou lógica que os homens tentem inventar. Ela é a razão de minha existência hoje. Ela é a minha família, ela é meu destino.
"Eis o segredo que ninguém sabe. Eis a raiz da raiz. O broto do broto, e o céu do céu de uma árvore chamada VIDA. Eis o milagre que mantém as estrelas à distância."
Já cheguei recitar-lhe parte desse poema de Cummings. Escondi, na verdade parte dele: esse trecho que acabei de escrever. Duas razões tive eu: 1) achei que não fosse entender a profundidade dessas expressões aparentemente tolas; 2) não me senti pronto para dizer esse versos que só ousei dizer à minha mãe.
Mas hoje eu senti a sua Luz. Precisamente e sinceramente, não cheguei a notá-la enquanto o tinha em meus braços. Senti sua alma, senti seu espírito, mas não pude identificar a luz. Hoje, quando eu ouvi sua voz rouca ao telefone, eu enxerguei perfeitamente essa Luz. E, lembrando dos momentos em que estive junto de você, sempre vi essa Luz. Só enxerga quem tem olhos. Isso faz muito sentido.
Na verdade, de modo geral, o texto não faz sentido algum. Mas acho que parei de acreditar em sentido, formulei e tenho formulado meu próprio jeito de ver a vida. Meus próprios parâmetros de verdade. Isso para mim é verdade. E poético, não acha?
Eu te amo não diz tudo. Eu te amo é uma expressão inventada pelos poetas para tentar dizer o que é a tal da Luz. Prefiro dizer: hoje, meu amor, você é a minha luz!
(a data como cabeçalho me serve para ler depois e ver quão insano estou sendo nessa noite, ou, entretanto, quão sensato estou tentando ser/parecer)

João Hernesto

15 de julho de 2009

Sentido

Estou em mais uma daquelas dores de conhecimento. Daquelas em que ouvi um simples verso sem sentido algum de Secos e Molhados e senti que deveria escrever. Hoje eu estou ouvindo um álbum chamado Stop Making Sense, de Talking Heads – hoje tentei encontrar a resposta para uma pergunta acerca dessa banda com um amiga.
Essa dor dói gostoso e desesperador. Estou faminto no sentido metafórico e no literal. Eu quero dividir essa insegurança com alguém. Quero olhos para me olharem daquele jeitinho que mãe dá.
Quero ler mais, entretanto sinto muito mais medo do que tinha antes de ler. Quero descobrir este mundo que parecia esperar por minha maturidade. Quero parar e voltar no tempo, no tempo em que eu não acreditava (isso foi há quase um dia). Gostaria de chorar, mas não posso, no sentido de habilidade. Quero que essas músicas não coubessem perfeitamente nesse momento sufocante.
Para começar, eu acordei e aceitei fiz uma proposta por transmissão de pensamento. Tomei um banho demorado - para que pudesse lavar todas as partes de meu corpo, ora ensaboando, ora perfumando e hidratando. Senti-me acordado. Comi bastante para continua a sentir satisfeito depois de quatro horas de trabalho. Senti vontade de alguma substância química que me era clara, e já não é mais.
Senti aquele impulso de procura, como um instinto sexual. Li sobre a religião da oração que fiz ontem, no sentido me ver adaptado em seus ensinamentos. Quanto tesão que senti. Como é bom descobrir e ser descoberto. Como é bom não saber o que encontrar e saber que vai gostar. Cheguei a pensar que não aconteceria esse sentimento de dor de conhecimento em mim.
Teoria do Caos, conhece?
Tudo o que li só me fez sentido aplicado à vida que vivo no momento em que vivi depois de conhecer aquilo, é muito claro. Era como se me dessem óculos super-mágicos através dos quais eu passasse a enxergar o mundo à minha volta – esse mundo que é sempre igualzinho – como um novo mundo.
Primeiro eu senti um aperto no coração porque senti que minha proposta não fora aceita, ou ainda pior, ela tivera sido esquecida. Dizem que o sentimento contrário ao amor é a indiferença. Isso é bem verdade. Porém agarrei-me à esperança da noite, afinal o dia não chegara ao seu fim.
Depois uma certa falta de consideração da parte de meus amigos no sentido de não me ouvirem as felicidades e medo em relação à descoberta. Além disso, aquela falta de paciência e tolerância dos mesmo para comigo. Isso dói não por causa de umas leituras, dói mais por causa delas, obviamente. Senti-me todo observado por estranhos e dilacerado pelas pessoas que mais amo.
Há vinte minutos (antes de começar a escrever este texto), eis que me bate a luz. “Hoje eu começo a estudar magia”, disse eu. Isso me faz contra a parede, é só por isso que eu não ganhei aquele sim que minha proposta estava a esperar. É claro! Maldita verdade. Isso me pareceu doer bem mais que a indiferença. Doeu também o ciúme que senti ao ler coisas que o outro escrevera. Desprezo aliado à traição é uma bosta, assim, no sentido de fezes mesmo...
Agora eu abro a caixa de meu e-mail. E não é que vejo três (não apenas um) e-mails?! Malditos que não me deixavam em paz o dia todo.
Agora eu estou feliz. Vou ler mais! Acenderei uma vela e mais outro incenso - dessa vez não um para calmaria, para proteção.
Hoje eu me descubro um pouco mais wiccan, e, obviamente, mais apaixonado. No sentido de mudança. No sentido do sentido.

Leandro Augusto

13 de julho de 2009

A Pele do Meu Amor

De todas as coisas que me são agradáveis assistir, a que me é favorita é ver meu amor dormindo. Gosto de sentir seu pensamento longe e condensado em qualquer sonho alheio a qualquer coisa que eu estiver pensando. Gosto de sentir o impacto de sua respiração em meu cobertor.
Gosto de ver o seu rosto. Suas linhas sem expressão. Delinear e dedilhar sua face e o meu amor nem percebe, por estar longe desse quarto. Eu gosto de ver o jeito com que sua testa constrói leves entradas e iniciam o coro cabeludo. Gosto do nariz do meu amor. Eu gosto muito de observar sua boca toda perfeita: carnuda, desenhada, delimitada pelo rosto e dona de um beijo que ninguém há de imitar. Eu gosto do seu beijo. Gosto de ver as suas bochechas e, então, reparar no formato que seu maxilar faz na virada do queixo até as orelhas. Gosto dos seus olhos um pouco puxados.
Gosto de manter na mente todas essas características para me lembrar enquanto o meu amor estiver acordado. Gosto de analisar suas expressões faciais. Por exemplo, me é incrível o fato de seus olhos conseguirem sorrir de um jeito puro e, questão de três minutos depois, sorrirem um sorriso safado de quem implora por mais paixão carnal. Gosto quando os olhos do meu amor ficam sérios. Gosto quando deixa de sorrir para fazer cara de amante. O melhor amante de todos. O sexo mais extravagante e ponderado. O sexo mais gostoso que eu já fiz.
Gosto, ainda, de sentir sua pele. Gosto de reparar que ela é macia e áspera ao mesmo tempo. Digo no sentido literal, nada de poeticidade. Suas mãos são mãos de donzela de contos de fadas. Suas mãos são macias, e eu me sinto a tocar nuvem de lá do céu. Seus braços são ásperos. Braços de homem brusco. Gosto do fato de serem ásperos. Gosto de sentir aspereza em seu toque. Gosto de sentir seus pelos a irem de encontro aos meus. Gosto de sentir seu tórax largo e quente. Ele me abraça e me faz queimar. Ele me abraça e faz o meu corpo refém. Meu corpo é refém de seu sexo. Meus lábios são refém de seus beijos. Fez-me refém o meu amor incondicional.
O meu amor me faz querer usar palavras bonitas, ele me faz mais parnasiano do que desejo ser. Faz-me brincar de ser poeta. Faz-me brincar de ser gente grande. Brincar de ser criança.
O que eu mais gosto no meu amor é a sua capacidade de não esconder o que sente. E demonstra tudo isso da forma mais clara. Demonstra nos olhos, nos lábios, na sobrancelha. Demonstra nos braços, nas pernas, no tórax. Demonstra na alma. Demonstra na alma quando sorri. Demonstra na alma quando me olha e para de rir com os olhos. Demonstra quando sorri apaixonado nos olhos. Quando inventa moda e sua língua diz eu te amo em idiomas diferentes. Quando sua pele arrepia e arrepia a minha também. Quando a pele queima e quando ela morna.
Eu reservo o meu coração para esse amor. Eu reservo palavras baratas e metáforas pobres. Não reservo rimas, faço a ritma de outras coisas. Coisas mais materiais. Reservo meus lábios, minha língua e meus dentes. Reservo meus olhos, meus óculos, meus ouvidos. Reservo meus braços, pernas e pés. Reservo minhas mãos, essencialmente. Reservo minha alma. Essas são minhas oferendas. Essas são tuas prerrogativas. Eu me entrego para ti tudo o que eu tenho de mais palpável como prova de meu amor. Tu aceitas te casar comigo hoje?

João Hernesto

6 de julho de 2009

Soft

Nós nos beijamos e senti aquela sensação que eu só costumo sentir com ele. Ficamos prontos para dormir. Eu o abracei com meus braços aconchegantes e ele respondeu com uma pele quente como tarde de verão. Uma pele que se mostrava acetinada e áspera ao mesmo tempo.
Imaginei um bom adjetivo que pudesse descrever tal toque. Melhor que macio é “soft”. Além de sua face semântica perfeitamente adaptada à esse sentimento que sinto, destaco também uma simples filosofia fonológica. Três consoantes é o som que ouvimos: primeiro o /s/ demonstra sua chegada de modo predominante e permanente; depois há o /f/ que parece soprar para longe como o vento o faz em dias como o de hoje; e, por último, encontra-se o /t/ que quebra de um jeito delicado e brusco essa palavra que me parece tão afetiva, esse som também me lembra um solo de bateria – a última das batidas de uma música (é um /ts/ breve). Além desse encontro consonantal, não posso deixar de notar e anotar o som completamente inglês de /o/, esse, que é o mesmo de “coffe”, me é precioso pelo fato de não ser nenhum som vocálico encontrado em meu idioma; ele é a razão pela qual eu apenas encontrei um adjetivo na língua inglesa e não na portuguesa.
Análises fonéticas à parte, eu senti o corpo estremecer com esse romance-antítese. É como um velho poeta dizia: o contentamento descontente. Eu sentia-me explodindo, queimando numa sintonia tão perfeita. Membros entrelaçados em um só corpo. Dois corpos se tocavam e tocavam também as almas. “Eu posso ver sua alma”, ele disse. Dito isso, eis que sinto uma mão a tocá-la. Ele me perfurou o corpo a ponto de tocar a alma. Ele tocou meu íntimo.
Ele dizia palavras poéticas e eu me continha em olhares, em beijos, em carícias. As carícias... Ah, as carícias... Elas não eram um simples tesão, elas eram gozo misturado a um amor que ninguém jamais há de descrever. Poeta algum. João Hernesto algum. Apaixonado do século XXI algum.
Hoje eu dormi e pude sentir sua respiração, pude sentir seus gemidos e seus sussurros. Eu hoje senti uma vontade de ficar na cama o dia todo, só para me dar o prazer de ver aquele bocejo de anjo outras vezes.
Eu hoje sinto meus lábios doendo de um jeito que sente saudade. Eu hoje quero aquilo de novo.
Quero fugir mais uma vez. Quero casar com você todos os dias da minha vida. Mas contento-me com a eternidade desses momentos
Ilusão preciosa a minha.

Leandro Augusto

2 de julho de 2009

The Corrs

Só se for para não voltar mais. Nesse caso eu fujo, para um lugar que ninguém conheça, que só eu e você vivamos. Um lugar que nós possamos nos amar com a lua para assistir. A nossa casa de praia, ao invés de república estudantil. O nosso lar. O nosso pecado terção. O nosso segredo obsceno, ao invés de meigo.
Eu fujo, sim, se você me prometer que não me vai permitir gostar desse tanto de mais ninguém. Se você prometer me amar e arder sempre que nossos olhos encontrarem uns com os outros. Se prometer, ainda, que vai me ensinar a ser assim, como você. Quero a perfeição também. Quero a angelicalidade.
Fugiríamos. Se você continuar a cantar e recitar poemas. Se você desenhar meu rosto, para o caso de a morte nos separar, aí você vai me ter sempre que quiser desenhar. Só fujo se você me estabelecer critérios para lhe amar. Se você me segurar pelo pé se eu resolver recusar nalgum dia minha felicidade.
Eu quero fugir com você.
Sempre que nos encontrarmos, seremos só eu e você. Nesses momentos nós seremos únicos e fugiremos. Seremos amantes e casados. Nós seremos namorados e amigos. Seremos cúmplices de um crime. Seremos reféns de rimas poéticas e caóticas. Seremos reféns, acima de tudo, desse amor arrebatador.
Eu fujo, obviamente!

Leandro Augusto