17 de outubro de 2010

Pseudo-eruditismo


A fila era grande. Todos buscavam, unidos, uma apreciação do conhecimento de outrem. Estavam todos muito ansiosos para ver o que os esperava lá dentro.

A fila começa a andar. Pessoas pulam de alegria. Aquele museu deveria ser a coisa mais importante da vida de alguém. A casa era simples, mas continha muita informação.

Entravam e só vinham o que uma casa comum tem a mostrar: uma sala com TV e sofás confortáveis, um pequeno corredor com duas portas, e uma cozinha branca e irritante.

Uma das portas era a entrada para a biblioteca. Lá estava o dono do quarto, de pijamas, escrevendo alguma coisa em seu computador antiquado. A estante de livros existia.

Bem vindos ao meu portal do conhecimento, disse o anfitrião. Livros de autores famosos. Autores brasileiros e autores internacionais.

Literatura consagrada. Filosofia e teologia consagradas. Livros de estudo científico e acadêmicos consagrados. Revistas consagradas. Arrumação desgraçada.

Era possível ouvir algumas interjeições de espanto e admiração. Todos gostariam de ter um arsenal bibliográfico como aquele: pequeno, entretanto bem pouco vazio.

Pensavam, ele deve ter lido cada um desses livros com grande afinco. Talvez alguns deles tivessem sido lidos mais de uma vez. Ele nem deve ter lido todos, outros pensavam.

Um em meio à multidão pegou um livro para folhear. Havia uma dedicatória na primeira página. O autor era famoso e consagrado. A arrumação, desgraçada.

Os outros olhavam com medo; não sabiam se podiam tocar em alguma coisa. O dono dos livros só escrevia e não se sentia incomodado. Todos pegaram um livro para folhear.

Liam em voz alta e, às vezes gritavam. Berravam e gargalhavam. Todos se divertiam com os livros comprados aos poucos. Os livros comprados e os livros roubados.

Posso pegar emprestado?, um deles disse. Não houve resposta. Ele só escrevia e se gabava por dentro por ser tão admirado.

Abriu a mochila e pegou o livro. Mês que vem eu devolvo, tá? Nada de resposta. Foi embora, deixando a multidão um pouco menor.

Barulho de pessoas abrindo bolsas, mochilas, sacolas e colocando livros e mais livros para pegar emprestado. Ele se gabava por dentro, afinal fazia sucesso seu gosto.

Quando todos já tinham ido embora, ele se levantou para fazer um café. Viu que a estante estava vazia. Nem um único livro restou. Sorriu. Gargalhou depois.

Lembrou-se que a grande maioria não havia sido lida depois da segunda página. Muitos deles tinham sido comprados só para mostrar mesmo.

Ele sorriu. A arrumação era desgraçada, mas os livros eram consagrados, a multidão espalhou aos quatro cantos.

No dia seguinte, uma fila se formava. Eram as mesmas pessoas para devolver os livros. Muito boa a primeira página desse aqui, comentavam.

João Hernesto.

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