O céu se misturando ao mar, o sol se destacando por entre as montanhas. O sussurro antes do beijo, o suspiro depois do beijo. A alegria ansiosa antes de conversar, a tristeza ansiosa antes de despedir. Hoje eu me sentei e resolvi escrever um texto doce. Hoje eu me sentei e resolvi escrever o que representas a mim. Hoje eu me sentei e escrevi este resultado que vem de dentro e se espalha em meu corpo e espírito antes mesmo que possa eu controlar. Este é mais um para ti.
Porque amar-te é mais do que querer-te por perto e ter-te por perto para proteção. Proteção do mundo lá fora. Porque amar-te é mais do que sentir aquela coceirinha que chega de leve quando tu falas que me amas. Amar-te é mais do que isso. Porque amar-te é perceber que as estrelas se alinham melhor quando meu mundo te tem. Porque amar-te é perceber a simetria que é formada nas figuras geométricas espalhadas pela cidade e vê-las totalmente perfeitas. Porque amar-te é notar que o sol pode brilhar mais forte a cada dia, a cada nascer.
Entretanto, não pretendo aqui justificar o fato de escrever este texto. Escrevo para tentar exteriorizar o que se passa aqui dentro. Escrevo puramente porque pretendo mostrar que sou a pessoa mais feliz do mundo e, é bem verdade, permaneço assim desde que te conheci. Desde que tudo principiou. Desde que reparei nos teus olhos de cão carente. Desde que reparei nos teus olhos de... Nos teus olhos de...
Creio que não me sinto totalmente pronto para expressar-me bem com relação aos olhos. Retórica dos namorados... Não, não funciona assim comigo. Talvez eu entenda que o homem não tem domínio de seu sistema linguístico o suficiente para nomear tamanha perfeição. Eu posso te desenhar por completo, aqui na minha cabecinha esquecida. Talvez eu seja mesmo um pouco bobo por pensar que um amor pode salvar o mundo todo, assim, como nas histórias em quadrinhos. Talvez eu esteja caindo em meu próprio pesadelo de achar que as coisas devem permanecer intactas, de que amores perfeitos existem, mas patologias não podem me ser colocadas. Ninguém me pode dizer que estou errado porque eu sei que, aqui dentro, terei sempre comigo esse teu sorriso de me tirar o ar, esse teu sorriso de me fazer sentar e tentar manifestar o que em mim manifestas. Esse teu sorriso que me faz perder a ordem do tamanho de meus parágrafos e a ortograifia das palavras, de tanto que me prende, de tanto que me embarca.
Não, não pretendo aqui dizer o tamanho de meu amor, não pretendo aqui discutir contigo sobre quem ama mais e tudo aquilo que fazemos em nossas deliciosas conversas intermináveis e termináveis, lamentavelmente. Não pretendo aqui buscar adjetivos ou metáforas perfeitas para ti. Meu amor por ti é sincero, mas pobre. Ele não pensa nas coisas de maneira muito grandiosa. Ele pensa nas coisas em seus sentidos mais puros e simples. Ele só te quer mais e mais. Ele só toma espaço na cabeça, no coração e na alma a cada minuto que passo com ou sem te ter a meu lado.
Ofereço-te flores e poemas toscos, mas meu coração, na verdade, pretende demonstrar os aspectos que foi moldando para caber tanto sentimento por uma só pessoa. Meu coração só te quer sempre mais, meu coração só quer poder mostrar que tu tens mais importância para minha vida anteriormente vazia do que qualquer poema ou flores podem expressar. Ele só quer um pouco de palavras novas. Um dia desses, se encontrasse as tais palavras, com plena certeza, as dedicaria a ti.
O céu se misturando ao mar, o sol se destacando por entre as montanhas. O sussurro antes do beijo, suspiro depois do beijo. A alegria ansiosa antes de conversar, a tristeza ansiosa antes de despedir. Hoje eu me sentei e tentei, em vão, expressar o quanto te quero bem. Talvez algum dia possa extrapolar um beijo terno ou um carinho feito com todo o meu coração para poder-te dizer que tu, em verdade, és tudo o que um dia desejei para mim e que, agora que estás no mundo, posso dizer-me preenchido com a felicidade que todos procuram. Eu a encontrei. Eu te encontrei.
Capadócio.
Ideias de personagens criados para viver muitos ou poucos textos. Formas e formatos distintos, experiências ímpares. Não importa quem seja, ouviremos com mesma intensidade.
25 de janeiro de 2012
20 de janeiro de 2012
O Plano
Entrava, aqui, mais uma de suas coincidências vitais. Deus armara uma armadilha e quem cai nela deve ser ágil para sair. É como distrair o inimigo. É como se o inimigo estivesse bem mais próximo que imaginasse. Então a coincidência se instaurava. Então era hora de distanciar. Hora de imaginar as coisas sob novas perspectivas. A guerra precisava ser dominada e ela só seria dominada se houvesse um planejamento.
Você precisa de fé, acho que falta isso em você. Fé.
Num piscar de olhos a vida faz mais sentido. Aquela metáfora pobre que me havia vindo há um tempo me volta à memória. Eu precisava encontrar dentro de mim a resposta para tanta repetição. Precisava buscar em mim a resposta de todas as perguntas do mundo. Talvez eu precisasse de fé. Talvez chegasse, enfim, o momento do juízo final. E a sentença é deliberada por mim mesmo.
Pretendo aqui colocar um fim nessa história de que devo acreditar nisso e não naquilo, de que devo me portar assim e não assado. Devo, primeiramente, deixar em mim as palavras entrarem, mas elas não entram. Não facilmente. Na verdade elas vêm e vão de maneira tão rápida que não posso sequer tateá-las. Só sei que precisava escrever e não sei exatamente que título dar a este texto que nem sequer está pronto em minha mente. As palavras vão. Ficam as palavras vãs.
O inimigo se aproxima, talvez você devesse mesmo combatê-lo. Há planos?
Não havia planos. Eu o combateria e veria até aonde meus músculos me levariam. De alguma forma, sentia que não viveria muito tempo dessa forma. Preciso pensar. Por exemplo, se o exercito oponente vier com armas de fogo, precisarei de um colete à prova de balas. Mas não basta apenas me defender, eu devo atacar juntamente. E é aí que eu me perco. Tomar as rédeas desse cavalo que nunca pára de andar para que pensemos no caminho a percorrer. Nunca pára. E eu penso e nunca saio do mesmo lugar. Enquanto isso, o cavalo me movimenta o corpo aleatoriamente nos espaços espaciais.
É pouco redundante botar à prova meus sentimentos e crenças acerca de um deus. Na verdade é necessário. Eu preciso acreditar que acredito em algo. Preciso saber que há uma proteção mínima e que não dependo somente de meu planejamento e de meu colete à prova de balas. Mas o inimigo se aproxima e ele tem um canhão. E eu me arrependo de não me haver preparado para esse tipo de imprevisto. De qualquer forma, vou ao ataque, sabendo, ainda assim, que não durarei mais que dois minutos.
Mas Deus não está aqui essa noite, padre. Deus está nos céus cuidando de assuntos dos céus. Vire-se e descubra como matar seu oponente.
Dois minutos depois, não tenho estratégia, mas tenho vida ainda. De uma forma que não sei nem saberia explicar, posso dizer que me vi vencer. Como quem vê de longe, vi o maior guerreiro do campo de batalha. E eu sobrevivi. É claro que meus oponentes permanecem intactos. É claro, ainda, que há ferimentos em minha armadura feita de pele, de minha própria pele. O sangue escorre e uma lágrima se seca. Eu continuo vivo, apesar de não ter planos. Os planos agora são: um, manter-me vivo, e, dois, bolar um plano.
João Hernesto.
Você precisa de fé, acho que falta isso em você. Fé.
Num piscar de olhos a vida faz mais sentido. Aquela metáfora pobre que me havia vindo há um tempo me volta à memória. Eu precisava encontrar dentro de mim a resposta para tanta repetição. Precisava buscar em mim a resposta de todas as perguntas do mundo. Talvez eu precisasse de fé. Talvez chegasse, enfim, o momento do juízo final. E a sentença é deliberada por mim mesmo.
Pretendo aqui colocar um fim nessa história de que devo acreditar nisso e não naquilo, de que devo me portar assim e não assado. Devo, primeiramente, deixar em mim as palavras entrarem, mas elas não entram. Não facilmente. Na verdade elas vêm e vão de maneira tão rápida que não posso sequer tateá-las. Só sei que precisava escrever e não sei exatamente que título dar a este texto que nem sequer está pronto em minha mente. As palavras vão. Ficam as palavras vãs.
O inimigo se aproxima, talvez você devesse mesmo combatê-lo. Há planos?
Não havia planos. Eu o combateria e veria até aonde meus músculos me levariam. De alguma forma, sentia que não viveria muito tempo dessa forma. Preciso pensar. Por exemplo, se o exercito oponente vier com armas de fogo, precisarei de um colete à prova de balas. Mas não basta apenas me defender, eu devo atacar juntamente. E é aí que eu me perco. Tomar as rédeas desse cavalo que nunca pára de andar para que pensemos no caminho a percorrer. Nunca pára. E eu penso e nunca saio do mesmo lugar. Enquanto isso, o cavalo me movimenta o corpo aleatoriamente nos espaços espaciais.
É pouco redundante botar à prova meus sentimentos e crenças acerca de um deus. Na verdade é necessário. Eu preciso acreditar que acredito em algo. Preciso saber que há uma proteção mínima e que não dependo somente de meu planejamento e de meu colete à prova de balas. Mas o inimigo se aproxima e ele tem um canhão. E eu me arrependo de não me haver preparado para esse tipo de imprevisto. De qualquer forma, vou ao ataque, sabendo, ainda assim, que não durarei mais que dois minutos.
Mas Deus não está aqui essa noite, padre. Deus está nos céus cuidando de assuntos dos céus. Vire-se e descubra como matar seu oponente.
Dois minutos depois, não tenho estratégia, mas tenho vida ainda. De uma forma que não sei nem saberia explicar, posso dizer que me vi vencer. Como quem vê de longe, vi o maior guerreiro do campo de batalha. E eu sobrevivi. É claro que meus oponentes permanecem intactos. É claro, ainda, que há ferimentos em minha armadura feita de pele, de minha própria pele. O sangue escorre e uma lágrima se seca. Eu continuo vivo, apesar de não ter planos. Os planos agora são: um, manter-me vivo, e, dois, bolar um plano.
João Hernesto.
16 de janeiro de 2012
A Noite da Insônia e o Dia da Evacuação
É chegada a hora de evacuar o edifício. Essa noite acordei algumas vezes. Tive uma noite horrível. Não por pesadelos. Não por dores no coração. Só não consegui dormir bem. Era como se uma coceira me invadisse e eu precisasse contê-la. Era como se um pedido me fosse feito e eu não soubesse exatamente o que fazer ou por onde começar ou, ainda, qual caminho percorrer. Não por sentir calor. Não por sentir frio. Não pude dormir, nada mais. Sem patologias extras. Não por elas. Por não poder fechar os olhos tranquilamente e embarcar no mundo do sono. Não pude dormir. É chegada a hora.
O relógio marcava nada. O sol não brilhava. As pessoas na rua, de lá de baixo, não emitiam som algum. Lá de baixo elas nada enxergavam. Lá de baixo, ninguém me via. Aqui de cima era eu e as flores, que já estavam morrendo. Bem, as flores morriam mais rápido em minha casa. Morriam porque não sabiam sobreviver em meio ao meu próprio caos. Morriam porque não podiam dormir. A noite foi terrível também para as flores de meu quarto. Meu quarto gritava e pedia que o ajudassem. Ninguém o fez. Éramos eu e as flores objetos inanimados, seres mortos, natureza morta. A noite foi terrível e era chegada a hora de evacuar o edifício. Ninguém se mexeu.
No alto desse morro chamado diversas vezes de edifício, as pessoas se trancafiavam e esperavam o sono bater. Só que o sono não vinha, era petulante. Era intransigente. O sono não vinha. O blues não mais acalmava. O rock’n roll chamava para dançar. O blues chamava para chorar. O rock’n roll chamava para badernar. Ninguém se mexeu. O sono não chegara. O edifício precisava ser evacuado. Ninguém se mexeu. Não por calor. Não por frio. Por não se mexer e só isso. Por não encontrar motivos. Por não haver razões para a evacuação. Ninguém ouviu nada naquela noite. Todos lutavam contra seus próprios quartos para que calassem. Os quartos gritavam. Era chegada a hora.
Levantei-me, preparei um chá mate. Não quis fazer café e não tive coragem de largar a cafeína. Ainda assim, chegara a hora. Debrucei-me o corpo na janela e observei as pessoas passando em silêncio. A dona Maria passava com seu carrinho de compra porque era dia de feira. Silenciosa. O poeta declamava suas poesias porque era dia de palavras ao vento. Silencioso. A dama do cachorrinho passava com o cachorrinho porque era dia de cachorrinho. Silenciosos. As amigas passavam fofocando porque era dia de passar. Silenciosas. O dono do prédio gritava a evacuação porque era chegada a hora. Silencioso. Ninguém se mexeu. Todos reclamávamos a noite de sono perdida. O sono não chegava. A cafeína entrava. O quarto gritava. Eu observava.
Era dia, mas o sol não brilhava. Era uma tarde ensolarada de noite. A noite permanecia aqui. Todos do prédio a sentíamos. Não havia estrelas e também não havia nuvens. Não havia raios de sol e também não havia sol. Não havia lua e também não havia luar. Não havia eu e também não havia tu. Não havia a gramática e também não havia a língua. Não havia. Não existia. A existência tornara-se contestável, apesar de ninguém a contestar. Contestávamos, sim, o quarto e o barulho que nos causava aos tímpanos. Todos acordados. Todos com uma insônia terrível. Tive uma noite horrível. É chegada a hora de evacuar o edifício.
João Hernesto.
O relógio marcava nada. O sol não brilhava. As pessoas na rua, de lá de baixo, não emitiam som algum. Lá de baixo elas nada enxergavam. Lá de baixo, ninguém me via. Aqui de cima era eu e as flores, que já estavam morrendo. Bem, as flores morriam mais rápido em minha casa. Morriam porque não sabiam sobreviver em meio ao meu próprio caos. Morriam porque não podiam dormir. A noite foi terrível também para as flores de meu quarto. Meu quarto gritava e pedia que o ajudassem. Ninguém o fez. Éramos eu e as flores objetos inanimados, seres mortos, natureza morta. A noite foi terrível e era chegada a hora de evacuar o edifício. Ninguém se mexeu.
No alto desse morro chamado diversas vezes de edifício, as pessoas se trancafiavam e esperavam o sono bater. Só que o sono não vinha, era petulante. Era intransigente. O sono não vinha. O blues não mais acalmava. O rock’n roll chamava para dançar. O blues chamava para chorar. O rock’n roll chamava para badernar. Ninguém se mexeu. O sono não chegara. O edifício precisava ser evacuado. Ninguém se mexeu. Não por calor. Não por frio. Por não se mexer e só isso. Por não encontrar motivos. Por não haver razões para a evacuação. Ninguém ouviu nada naquela noite. Todos lutavam contra seus próprios quartos para que calassem. Os quartos gritavam. Era chegada a hora.
Levantei-me, preparei um chá mate. Não quis fazer café e não tive coragem de largar a cafeína. Ainda assim, chegara a hora. Debrucei-me o corpo na janela e observei as pessoas passando em silêncio. A dona Maria passava com seu carrinho de compra porque era dia de feira. Silenciosa. O poeta declamava suas poesias porque era dia de palavras ao vento. Silencioso. A dama do cachorrinho passava com o cachorrinho porque era dia de cachorrinho. Silenciosos. As amigas passavam fofocando porque era dia de passar. Silenciosas. O dono do prédio gritava a evacuação porque era chegada a hora. Silencioso. Ninguém se mexeu. Todos reclamávamos a noite de sono perdida. O sono não chegava. A cafeína entrava. O quarto gritava. Eu observava.
Era dia, mas o sol não brilhava. Era uma tarde ensolarada de noite. A noite permanecia aqui. Todos do prédio a sentíamos. Não havia estrelas e também não havia nuvens. Não havia raios de sol e também não havia sol. Não havia lua e também não havia luar. Não havia eu e também não havia tu. Não havia a gramática e também não havia a língua. Não havia. Não existia. A existência tornara-se contestável, apesar de ninguém a contestar. Contestávamos, sim, o quarto e o barulho que nos causava aos tímpanos. Todos acordados. Todos com uma insônia terrível. Tive uma noite horrível. É chegada a hora de evacuar o edifício.
João Hernesto.
13 de janeiro de 2012
Leia as Notícias sobre seu Paradeiro
- Então, o que é que vai ser?
Ele lia com jeito de quem não entendeu a piada. Palavras novas, léxico avantajado para o lado esquerdo, ou teria sido o direito? As pessoas perguntavam-lhe coisas e nada ele respondia. Só estagnava a mesma pergunta. O mesmo questionamento. As mesmas ideias lhe ocorriam.
- Então, o que é que vai ser?
Enquanto tomava um gole de sua água, porque não podia tomar café nem chá e nunca gostou de refrigerante ou suco, pensou no que interpretar dessas coisas. Pensou e pensou. Decidiu que não faria absolutamente nada, como antes. Ficaria sentado desfrutando a água, que, por essas horas já estava acabando.
- Então, o que é que vai ser?
O que seria é que ele tentaria caminhar. Não quis mais levar a vida dessa forma. Decidiu-se e levantou. O mundo rodou um pouco, talvez. Ou talvez sua cabeça estivesse rodando no mesmo lugar. Não podia distinguir aonde, do caos, começava a confusão e aonde começava o caos da confusão. Sabia que vivia entre os dois. Chegara a hora de escolher qual lado seguir.
- Então, o que é que vai ser?
Foi assim como... Foi de um jeito torto. Cambaleou. Não, tropeçou e cambaleou para se levantar. Trocou as pernas de lugar com os braços e caminhou, apenas caminhou. Não caminhou, pensou ter caminhado. Quando deu por si, estava exatamente no mesmo lugar. E não se movimentou. E nada fez. E nada pensou. Assim como antigamente. Do mesmo jeito de antes. Parado. Pausado. Interrompido. Pontuado. Ponto final.
- Então, o que é que vai ser?
R
E
T
I
C
Ê
N
C
I
A
S
.
.
.
Adélia.
Ele lia com jeito de quem não entendeu a piada. Palavras novas, léxico avantajado para o lado esquerdo, ou teria sido o direito? As pessoas perguntavam-lhe coisas e nada ele respondia. Só estagnava a mesma pergunta. O mesmo questionamento. As mesmas ideias lhe ocorriam.
- Então, o que é que vai ser?
Enquanto tomava um gole de sua água, porque não podia tomar café nem chá e nunca gostou de refrigerante ou suco, pensou no que interpretar dessas coisas. Pensou e pensou. Decidiu que não faria absolutamente nada, como antes. Ficaria sentado desfrutando a água, que, por essas horas já estava acabando.
- Então, o que é que vai ser?
O que seria é que ele tentaria caminhar. Não quis mais levar a vida dessa forma. Decidiu-se e levantou. O mundo rodou um pouco, talvez. Ou talvez sua cabeça estivesse rodando no mesmo lugar. Não podia distinguir aonde, do caos, começava a confusão e aonde começava o caos da confusão. Sabia que vivia entre os dois. Chegara a hora de escolher qual lado seguir.
- Então, o que é que vai ser?
Foi assim como... Foi de um jeito torto. Cambaleou. Não, tropeçou e cambaleou para se levantar. Trocou as pernas de lugar com os braços e caminhou, apenas caminhou. Não caminhou, pensou ter caminhado. Quando deu por si, estava exatamente no mesmo lugar. E não se movimentou. E nada fez. E nada pensou. Assim como antigamente. Do mesmo jeito de antes. Parado. Pausado. Interrompido. Pontuado. Ponto final.
- Então, o que é que vai ser?
R
E
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C
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Adélia.
10 de janeiro de 2012
Seis
Passei a manhã toda pensando naquilo como se tivesse sido ontem. Mas foi anteontem. Ou teria sido antes ainda? Creio que perdi a noção do tempo e que os meus dias que sucederam a isso me fizeram ter nada mais que um desligamento do real e o inventário tomou conta de mim. Você, caro leitor, deve pensar que seu protagonista tenha ficado louco, mas não ficou. Ele só tem culpa e ódio de si mesmo por não saber nem por onde iniciar sua história. Bem, tentarei agora.
Eu tinha acabado de tomar banho. Antes ainda, tinha encontrado um disco do Gardel que estava desaparecido. Coloquei para tocar e tomar banho. Quando saí do banho, o lado A já havia sido tocado, o que me fez pensar que o banho teria sido muito longo. De qualquer forma, troquei o lado do disco e me dei por satisfeito pelo relaxante banho que acabara de tomar. Fui arrumar-me com calma, pensei que não tinha porque correr se quem me esperava poderia esperar mais alguns minutos.
Enquanto me arrumava, percebi como o disco dos Beatles que estava pensando em ouvir depois tinha dois lados distintos: o primeiro deles era de um estilo mais roque, tinha uma quedinha para o início da carreira do grupo; o segundo lado começava com sítaras e batidas em tambores psicodélicos, dignos de um psicodélico de plantão. Imaginava o que se passou na cabeça deles e ri com meu pensamento tolo. Escolhi minha gravata favorita e desejei ser apropriada, apesar de sempre achá-la apropriada.
Enquanto saía de casa e trancava a porta, o vento batia para o leste e o sol brilhava para o oeste, mas isso não me chamou tanto a atenção quanto as seis linhas de cada parágrafo deste meu novo texto. Pensei se havia um propósito e disse para mim mesmo: “há tanto propósito em escrever um texto que contenha parágrafos de seis linhas quanto usar minha gravata favorita num dia especial e nos dias normais e persistir em achar que ela é especial”. E foi aí que percebi que ultrapassara uma linha das minhas seis.
Mas depois notei que não havia linha alguma ultrapassada. Ri sozinho na rua, enquanto pessoas passavam para trabalhar e crianças – que são pessoas igualmente, apesar de minha estranha construção – iam para a escola com seus pais – que se admitem como pessoas, ainda. A vizinhança de minha casa era bastante tranquila, mas somente enquanto ainda estava na minha rua. A partir do momento em que se ultrapassava a linha da próxima esquina, perdia-se a paz e o sossego. Mas eu não ultrapassei as seis aqui.
Havia comerciantes na rua e eles queriam vender alguma nova bugiganga para mim. Mas eu não queria bugiganga, queria apressar-me para pegar o próximo trem para o Braz. No trem, não há nada para contar que seja pertinente aqui colocar. Na verdade, há tanta importância em contar o que aconteceu no trem quanto usar minha gravata de todo dia numa data especial. Era uma segunda colorida e o vento se misturava às gotículas de chuva, já que no caminho de trem começara a chover e eu nem percebera.
Ainda sobre o vento, a luz, a chuva, o arco-íris que eu desejei ver, notei que o mundo estava se esvaziando por causa da chuva. Notei um carro de polícia e notei também que o trem estava mais lotado que o normal. Aquele mesmo trem que pego desde criança e que peguei ainda agora estava lotado de policiais e pessoas curiosas. Ele estava parado. Eu também estava parado. Só que, dessa vez eu estava no galpão da ferrovia e era feliz com minha xícara de café.
Seria este mais um conto fantástico? Creio que não. Ou será que sim? Afinal de contas, que problema há em contos fantásticos? O coração do homem é fantástico. A mente humana é fantástica e nos pega mentindo para a realidade. A gravata era fantástica com aquelas novas cores de tom avermelhado que adquiriu. A viagem de trem mais longa era fantástica por ser longa e ter-me mudado para sempre. Fantásticos eram os olhos dos psicopatas que olhavam suas vítimas. Fantástico era o olhar daquela gente para o corpo estirado no vagão. Mas acredito que esse último parágrafo já ficou maior do que o esperado. Bem, continuarei o processo como quem quer aumentar as linhas e fazer um número que seja múltiplo de seis. Tolo meu pensamento, mas a ideia aqui é permanecer nesse padrão, que eu acabo de quebrar. Nesse caso, um novo padrão é posto e o tradicional é questionado. Isso acontece a todo momento, sabe. Na realidade, isso me aconteceu no trem. O padrão de viver. O padrão de ter o livre arbítrio dos vivos. Mas agora estou morto e meu assassino acaba de sair como quem nada fez. Os policiais nada fizeram. Eles não fizeram nada. Só chamaram a ambulância e recolheram meu corpo. Mas eu não queria mais um corpo, agora tinha meu espírito e minha gravata vermelha de sangue. Na verdade, há tanta importância em contar o que aconteceu no trem quanto usar minha gravata de todo dia numa data especial. Só mais uma linha e um cigarro e posso desviar-me para o que aconteceu depois disso.
Bem, quando terminei meu cigarro de fantasma, percebi que deveria escrever o que me havia acontecido. E foi aí e só aí que percebi que ainda estava atrasado para meu encontro. Como não sabia o que os deuses pensavam sobre tempo e o que os fantasmas percebiam como tempo, pensei em pentear meu cabelo, limpar a mancha de sangue em meu braço e seguir meu caminho de volta para casa. Embarquei no próximo trem ao centro e me sentei no próximo assento vago.
Cheguei em casa, liguei a vitrola e ouvi o segundo lado do Sargent Peppers. Disfrutei da sítara e dos tambores. Percebi que os céus se esqueceram de me avisar da sentença, mas permaneci esperando que ela chegasse, porque tinha de chegar, sabe. Sentei-me no chão como não fazia há tempos e desejei tomar um whiskey. Coloquei muito gelo no copo e tomei whiskey com a água que derretia do gelo. Percebi que o número seis estampado naquele trem me fez escrever. E me deu mais um personagem.
Sargent Peppers.
Eu tinha acabado de tomar banho. Antes ainda, tinha encontrado um disco do Gardel que estava desaparecido. Coloquei para tocar e tomar banho. Quando saí do banho, o lado A já havia sido tocado, o que me fez pensar que o banho teria sido muito longo. De qualquer forma, troquei o lado do disco e me dei por satisfeito pelo relaxante banho que acabara de tomar. Fui arrumar-me com calma, pensei que não tinha porque correr se quem me esperava poderia esperar mais alguns minutos.
Enquanto me arrumava, percebi como o disco dos Beatles que estava pensando em ouvir depois tinha dois lados distintos: o primeiro deles era de um estilo mais roque, tinha uma quedinha para o início da carreira do grupo; o segundo lado começava com sítaras e batidas em tambores psicodélicos, dignos de um psicodélico de plantão. Imaginava o que se passou na cabeça deles e ri com meu pensamento tolo. Escolhi minha gravata favorita e desejei ser apropriada, apesar de sempre achá-la apropriada.
Enquanto saía de casa e trancava a porta, o vento batia para o leste e o sol brilhava para o oeste, mas isso não me chamou tanto a atenção quanto as seis linhas de cada parágrafo deste meu novo texto. Pensei se havia um propósito e disse para mim mesmo: “há tanto propósito em escrever um texto que contenha parágrafos de seis linhas quanto usar minha gravata favorita num dia especial e nos dias normais e persistir em achar que ela é especial”. E foi aí que percebi que ultrapassara uma linha das minhas seis.
Mas depois notei que não havia linha alguma ultrapassada. Ri sozinho na rua, enquanto pessoas passavam para trabalhar e crianças – que são pessoas igualmente, apesar de minha estranha construção – iam para a escola com seus pais – que se admitem como pessoas, ainda. A vizinhança de minha casa era bastante tranquila, mas somente enquanto ainda estava na minha rua. A partir do momento em que se ultrapassava a linha da próxima esquina, perdia-se a paz e o sossego. Mas eu não ultrapassei as seis aqui.
Havia comerciantes na rua e eles queriam vender alguma nova bugiganga para mim. Mas eu não queria bugiganga, queria apressar-me para pegar o próximo trem para o Braz. No trem, não há nada para contar que seja pertinente aqui colocar. Na verdade, há tanta importância em contar o que aconteceu no trem quanto usar minha gravata de todo dia numa data especial. Era uma segunda colorida e o vento se misturava às gotículas de chuva, já que no caminho de trem começara a chover e eu nem percebera.
Ainda sobre o vento, a luz, a chuva, o arco-íris que eu desejei ver, notei que o mundo estava se esvaziando por causa da chuva. Notei um carro de polícia e notei também que o trem estava mais lotado que o normal. Aquele mesmo trem que pego desde criança e que peguei ainda agora estava lotado de policiais e pessoas curiosas. Ele estava parado. Eu também estava parado. Só que, dessa vez eu estava no galpão da ferrovia e era feliz com minha xícara de café.
Seria este mais um conto fantástico? Creio que não. Ou será que sim? Afinal de contas, que problema há em contos fantásticos? O coração do homem é fantástico. A mente humana é fantástica e nos pega mentindo para a realidade. A gravata era fantástica com aquelas novas cores de tom avermelhado que adquiriu. A viagem de trem mais longa era fantástica por ser longa e ter-me mudado para sempre. Fantásticos eram os olhos dos psicopatas que olhavam suas vítimas. Fantástico era o olhar daquela gente para o corpo estirado no vagão. Mas acredito que esse último parágrafo já ficou maior do que o esperado. Bem, continuarei o processo como quem quer aumentar as linhas e fazer um número que seja múltiplo de seis. Tolo meu pensamento, mas a ideia aqui é permanecer nesse padrão, que eu acabo de quebrar. Nesse caso, um novo padrão é posto e o tradicional é questionado. Isso acontece a todo momento, sabe. Na realidade, isso me aconteceu no trem. O padrão de viver. O padrão de ter o livre arbítrio dos vivos. Mas agora estou morto e meu assassino acaba de sair como quem nada fez. Os policiais nada fizeram. Eles não fizeram nada. Só chamaram a ambulância e recolheram meu corpo. Mas eu não queria mais um corpo, agora tinha meu espírito e minha gravata vermelha de sangue. Na verdade, há tanta importância em contar o que aconteceu no trem quanto usar minha gravata de todo dia numa data especial. Só mais uma linha e um cigarro e posso desviar-me para o que aconteceu depois disso.
Bem, quando terminei meu cigarro de fantasma, percebi que deveria escrever o que me havia acontecido. E foi aí e só aí que percebi que ainda estava atrasado para meu encontro. Como não sabia o que os deuses pensavam sobre tempo e o que os fantasmas percebiam como tempo, pensei em pentear meu cabelo, limpar a mancha de sangue em meu braço e seguir meu caminho de volta para casa. Embarquei no próximo trem ao centro e me sentei no próximo assento vago.
Cheguei em casa, liguei a vitrola e ouvi o segundo lado do Sargent Peppers. Disfrutei da sítara e dos tambores. Percebi que os céus se esqueceram de me avisar da sentença, mas permaneci esperando que ela chegasse, porque tinha de chegar, sabe. Sentei-me no chão como não fazia há tempos e desejei tomar um whiskey. Coloquei muito gelo no copo e tomei whiskey com a água que derretia do gelo. Percebi que o número seis estampado naquele trem me fez escrever. E me deu mais um personagem.
Sargent Peppers.
3 de janeiro de 2012
Intenso
Buenos Aires, 27 de Dezembro de 2011.
Querido,
O motivo pelo qual escrevo-lhe é somente meu. Não sei exatamente se lerá ou se este texto nunca chegará a seu contato. Fato é que sinto nossa situação ainda pendente. Aquela velha frase de "tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas" me vem à mente num momento como este. De alguma forma, parece-me que um desejo de bom ano novo resolva minha coceira, minha gagueira, meu engasgo.
Gostaria que soubesse que pensei em te ligar antes que saísse do Brasil. Pensei ainda em te mandar um e-mail ou uma mensagem na rede social. Pensei em escrever muitos agradescimentos ou muitos desejos. Pensei em não passar do "um bom ano novo". Todas as possibilidades eram tolas e plausíveis ao mesmo tempo. Ao final, escrevo em silêncio, como resolvi guardar meu amor por você, silenciado.
Os dias têm sido muito bons e a ordem tem sido estabelecida novamente desde que você se foi. Acho que você estava certo, doía em mim porque eu não aceitava perder-lhe. Doía em mim porque eu desconhecia o mundo sem você. O sol foi brilhando por entre as nuvens aos poucos e a temporada de chuvas passou, enfim. Na realidade, está passando. Algumas vezes me dói demasiado, mas silencio a dor e me faço capaz de suportá-la para depois esquecê-la. Calejei-me por sentir falta.
Pela primeira vez desde você, esse texto sobre você me vem pensado. Não é uma náusea incontrolável como os outros. É cauteloso, realista, discursivo - não enunciativo por si próprio. Deixa-me muito contente saber que você me já não faz parte do que eu mesmo construi, a minha armadura (in)destrutível. Dessa vez, você não é o que minha imaginação constrói, você é o que, de fato, é.
De qualquer forma, é maravilhoso enxergar-lhe assim: real. Dessa maneira, faz sentido a separação assim como o faz a união, a eterna união. Guardo comigo todos os momentos maravilhosos que dividi com você, esperando que haja muitos também para você. Guardo como que contadas as vezes em que nos chamamos de "morrzão" e todos os almoços, filmes, cócegas, transas, brigas que tivemos. Guardo com muito carinho sua imagem e faço questão de mantê-la sempre acesa, entretanto, silenciada.
Desejo sinceramente que tenha um ano muitíssimo produtivo em todos os setores de sua vida. Todos mesmo. Desejo que sua virada seja melhor que a virada desse ano de 2011, em que brigamos um com o outro sem sentido, sem razão. De qualquer forma, para mim, foi a melhor virada de ano que tive só porque eu estava com você. Agora, terei muitas outras e elas tomarão o primeiro lugar. Espero que nossos momentos sejam por você guardados e que os que lhe ocupam primeiro lugar deixem de ocupar sem que percam sua intensidade.
Um forte abraço,
Leandro Augusto.
Querido,
O motivo pelo qual escrevo-lhe é somente meu. Não sei exatamente se lerá ou se este texto nunca chegará a seu contato. Fato é que sinto nossa situação ainda pendente. Aquela velha frase de "tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas" me vem à mente num momento como este. De alguma forma, parece-me que um desejo de bom ano novo resolva minha coceira, minha gagueira, meu engasgo.
Gostaria que soubesse que pensei em te ligar antes que saísse do Brasil. Pensei ainda em te mandar um e-mail ou uma mensagem na rede social. Pensei em escrever muitos agradescimentos ou muitos desejos. Pensei em não passar do "um bom ano novo". Todas as possibilidades eram tolas e plausíveis ao mesmo tempo. Ao final, escrevo em silêncio, como resolvi guardar meu amor por você, silenciado.
Os dias têm sido muito bons e a ordem tem sido estabelecida novamente desde que você se foi. Acho que você estava certo, doía em mim porque eu não aceitava perder-lhe. Doía em mim porque eu desconhecia o mundo sem você. O sol foi brilhando por entre as nuvens aos poucos e a temporada de chuvas passou, enfim. Na realidade, está passando. Algumas vezes me dói demasiado, mas silencio a dor e me faço capaz de suportá-la para depois esquecê-la. Calejei-me por sentir falta.
Pela primeira vez desde você, esse texto sobre você me vem pensado. Não é uma náusea incontrolável como os outros. É cauteloso, realista, discursivo - não enunciativo por si próprio. Deixa-me muito contente saber que você me já não faz parte do que eu mesmo construi, a minha armadura (in)destrutível. Dessa vez, você não é o que minha imaginação constrói, você é o que, de fato, é.
De qualquer forma, é maravilhoso enxergar-lhe assim: real. Dessa maneira, faz sentido a separação assim como o faz a união, a eterna união. Guardo comigo todos os momentos maravilhosos que dividi com você, esperando que haja muitos também para você. Guardo como que contadas as vezes em que nos chamamos de "morrzão" e todos os almoços, filmes, cócegas, transas, brigas que tivemos. Guardo com muito carinho sua imagem e faço questão de mantê-la sempre acesa, entretanto, silenciada.
Desejo sinceramente que tenha um ano muitíssimo produtivo em todos os setores de sua vida. Todos mesmo. Desejo que sua virada seja melhor que a virada desse ano de 2011, em que brigamos um com o outro sem sentido, sem razão. De qualquer forma, para mim, foi a melhor virada de ano que tive só porque eu estava com você. Agora, terei muitas outras e elas tomarão o primeiro lugar. Espero que nossos momentos sejam por você guardados e que os que lhe ocupam primeiro lugar deixem de ocupar sem que percam sua intensidade.
Um forte abraço,
Leandro Augusto.
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